sexta-feira, 7 de novembro de 2014

ESPECIAL HOLANDA 1974: PARTE 4 (2): MODELO DE JOGO HOLANDES - ORGANIZAÇÃO OFENSIVA PARTE 1

Ola galera da prancheta. Depois de muito tempo e a pedidos, resolvi retomar o especial do Carrossel Holandês de 1974. Com o objetivo de fortalecer o especial Metalinguagem Tatica com mais um exemplo, retrabalharei nele e desenvolverei os dois textos em paralelo. Na época tive problemas com meus arquivos e os havia perdido, os reencontrei e vou colocar um dos meus sonhos que era analisar esse esquadrão para frente.

Para os que não leram os posts anteriores, mais com abordagem histórica, mostrarei aqui:

http://www.apranchetatica.com.br/2014/01/especial-holanda-1974-arte-de-um.html
http://www.apranchetatica.com.br/2014/01/especial-holanda-1974-arte-de-um_27.html
http://www.apranchetatica.com.br/2014/01/especial-holanda-1974-arte-de-um_31.html
http://www.apranchetatica.com.br/2014/02/especial-holanda-1974-arte-de-um.html



Boa releitura!

PARTE 4(2.1): MODELO DE JOGO HOLANDÊS

Ao contrário do que muitos dizem, o Carrossel Holandês não era uma desorganização completa, muito menos possuía tanta liberdade quanto se diz. Haviam padrões nas permutas e é isso que constituía o modelo de jogo deles. Todo modelo de uma equipe é dividida em princípios gerais (macro-princípios), que tendem a ser comportamentos primários de uma equipe,  sub-princípios, que são comportamentos mais específicos e sub-sub-princípios, que são detalhamentos dos comportamentos específicos, todos dentro das determinadas fases de jogo possíveis (Organização Ofensiva, Transição Defensiva, Defesa Desorganizada, Defesa Organizada, Transição Ofensiva, Ataque Desorganizado). Em ordem de cronologia das situações num jogo, relatarei o modelo implementado por Michels: 

A) ORGANIZAÇÃO OFENSIVA

Quando possuía a posse de bola e o adversário estava organizado, o carrossel holandês mostrava sua magia. Constantes trocas de posições, formações de triângulos, bola de pé em pé, leitura perfeita do espaço e compactação ofensiva no terreno adversário, tudo liderado pelo craque Cruyff, que era constantemente opção de passe prioritária em todas as áreas do campo. Abaixo, analisarei os padrões que pude observar:

A.1) INICIAÇÃO (FASE 1 OFENSIVA):

Macro-principio: Saída de bola através de passe CURTO buscando um dos componentes da primeira linha de 4, mais profunda no campo e subsequente progressão até proximidades do meio de campo. Temporização baixa, time com ritmo lento nessa fase de jogo buscando chegar com calma a segunda fase sem erros. Linha de 3 do meio fica mais a frente, se movimenta e abre espaços na intermediaria adversária.

Subprincipio 1: Saída prioritária nos dois jogadores centrais mais próximos (normalmente os zagueiros Haan ou Rijbergen, mas comumente se via um dos três volantes ou ate Cruyff vindo buscar jogo quando um dos defensores saía para caçar), que progridem com a bola no terreno enquanto não são pressionados. Em caso de pressão, toque curto para o zagueiro ao lado ou ao lateral do lado da bola. Laterais dão opções pelos lados.


Na imagem a esquerda, a saída de 4 comumente utilizada e a opção pela bola no pé de Haan. A direita, um flagrante de Rijsbergen progredindo a pelota bem a frente no campo. Abaixo, uma amostra das permutas. Suurbier havia subido no terreno na jogada anterior, Van Hanegen aprofundou e Rijsbergen abriu a direita para a perfeita ocupação dos espaços.

Subprincipio 2: Quando a bola saía pelo meio com um dos laterais,  o volante do lado da bola busca a borda do campo para receber a bola de frente.

Subprincipio 3: Quando se agregavam mais de dois jogadores a faixa central da saída de bola (normalmente 2 zagueiros + outro da frente que viria a buscar a bola mais atrás para progredir, normalmente Cruyff/Van Hanegen), os jogadores mais próximos abertos (normalmente os laterais, mas poderíamos ter o volante do lado fazendo o mesmo) subiam no terreno para dar amplitude ao meio campo.


A esquerda, dois exemplos claros do subprincipio 3. Cruyff e Van Hanegen vem buscar jogo e laterais se projetam. Ja a direita, mostras do subprincipio 2, quando os laterais estavam mais afunilados progredindo, os volantes dos lados (Jansen e Van Hanegen), para evitar que se ocupe o mesmo espaço, abriam para receber a bola de frente.


Macro-principio 2: Após progressão no terreno até mais ou menos a linha de meio de campo, o central portador deve ter como opções de passe prioritárias: um jogador ao lado dando opção de retorno ou virada de jogo, um jogador aberto encostando para desenvolver jogo pelos lados (normalmente o lateral) e um jogador dando apoio interior (um dos meias) para manter o jogo pelo centro. Se Cruyff for uma das opções, o passe deve ser para ele, seja lá em qual das 3 possibilidades ele esteja posicionado.



Bola com Krol na esquerda: Cruyff sempre como apoio, dessa vez pelo centro; Van Hanegen abre para receber de frente e Rijsbergen como opção de retorno.


A.2) DESENVOLVIMENTO DA JOGADA (FASE 2 OFENSIVA):

Era o setor onde o estilo Carrossel mais se destacava. As trocas de posições, movimentações, aberturas de espaço e ultrapassagens eram mais frequentes nessa fase. O ritmo aumentava a partir desse espaço, com temporização (ritmo) média para alta. O time subia em bloco, conceito novo para a época, a linha defensiva se mantinha na linha divisória do campo e facilitava o pressing futuro em caso de perda de bola. Buscavam mais o jogo pelos lados, sempre muito bem ocupados.


A.2.1) PADRÕES NOS CORREDORES LATERAIS:

A.2.1.1) COM BOLA NO SETOR LATERAL

Macroprincípio 1: Formação da sociedade lateral para gerar superioridade numérica. Dois jogadores ocupam o mesoespaço (região longitudinal de transição lateral-centro), um mais avançado outro mais recuado e um abre o campo na ponta.

Macroprincipio 2: Uso do recurso das triangulações. Aumento do ritmo de jogo, buscando acelerar para deixar o lateral adversário confuso e atacar as suas costas. Quando o portador passa, ele logo se desmarca buscando atacar espaços mais a frente. A cobertura defensiva adversária é inibida pelo membro da sociedade mais a frente, que se movimenta a liberando espaço as costas do adversário em contenção. 

Quadro explicativo do Macroprincipio 1: Campo dividido em 5 faixas verticais.  Dois tendem a ocupar a região de mesoespaço e um tende a abrir mais o espaço. A direita, exemplo com o portador da bola mais aberto (Suurbier) e os dois homens no mesoespaço obedecendo os dois subprincipios abaixo. A esquerda, portador no mesoespaço e homens sem bola obedecendo subprincipios. Deixando claro que qualquer um poderia vir a ocupar um espaço nas sociedades! OCUPAÇÃO PERFEITA DOS ESPAÇOS!

Macroprincipio 2: Jansen, homem mais a frente da sociedade, busca a diagonal e abre espaço para a subida de Suurbier

Subprincipio 1: A permuta posicional é constante e feita em alta velocidade, podendo qualquer um da equipe estar em qualquer posição dessas sociedades desde que elas estejam formadas.

Permuta posicional obedecendo ideias das sociedades

Subprincipio 2: Quanto as movimentações dos jogadores sem bola da sociedade: um busca a direção da linha de fundo, mais aberto, e outro busca a direção diagonal ao bico da área, mais fechado. Uso de triangulações

Subsubprincipio: Quando o atacante do lado busca jogo atrás mais afunilado, o espaço as suas costas (linha de fundo) deve ser ocupado pela projeção de um dos jogadores mais recuados.

Em 1, exemplo de sociedade na esquerda, com Cruyff portador fechado, Krol aberto buscando a linha de fundo e Resenbrink fechado mais a frente entrando na diagonal. Em 2, flagra da aplicação do subsubprincipio. Em 3, sociedade na direita que mostra muito das permutas posicionais, com Cruyff aberto, Hanegen com a bola e Rep mais a frente. Em 4, agregação de mais um a sociedade lateral direita e dupla ocupação do lado com Suurbier mais a frente e Rep mais atrás.

Macroprincipio 3: Quando o adversário estiver suficientemente organizado, deixando o lado da bola com muita densidade, busca-se a virada de jogo para que o ataque possa se proceder. Situação ocorre principalmente quando Cruyff busca jogo pelos lados.

Subprincipio 1: Virada em bola longa normalmente feita por Cruyff ou Van Hanegen buscando lateral ou ponta oposto bem aberto

Subprincipio 2: Virada através de passes curtos, passando pelo jogador mais central da equipe que esteja na mesma altura da bola e chegando ao lateral/ponta oposto já com a sociedade formada. Equipe já se posiciona pensando nessa possibilidade de jogo horizontal.

Posicional holandês já prevendo possíveis viradas de jogo de pé em pé

A.2.1.2) SEM BOLA NO SETOR LATERAL

Macroprincipio: Quando a bola se encontra no centro, o time abre o campo, com laterais e pontas (Suurbier/Rep, Krol/Resenbrink) bem proximos ocupando os corredores laterais, permutando, esperando oportunidades de infiltração nas costas dos laterais adversários e apoiados pelos meias por dentro. Já pudemos ver isso em prints anteriores.

Pontas abertos com a bola no meio

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Na segunda parte do post sobre a organização ofensiva holandesa, falarei sobre os padrões na fase 2 nas faixas centrais, as diversas opções e os padrões da fase final ofensiva. Boa leitura!